SANGUE NEGRO
"Lobos em pele de lobos"
Como se a realidade fosse feita de um total negrume e tudo o que houvesse no pensamento adormecido do universo fosse um quadro negro e estático, as imagens vão queimando a tela, intrusa aparição, ferida que ao se abrir cria figuras, objetos, cenários, seres humanos. Existe o deserto, existe o petróleo. E existe o homem. Existe a dor deste invasor ante a monstruosidade de uma luz que parece pecar, suando-lhe nas faces, afogando-o no pó, no árduo trabalho de garantir sua sobrevivência. Existe o escândalo das coisas silenciosas, e existe o silêncio, propriamente dito, da pequenez da vida humana.
Assim, surgem os primeiros, longos e silenciosos minutos de Sangue Negro. Inesquecível como em 2001-Uma Odisséia no Espaço, de Kubrick. Mensagem direta que percorre todo o filme: a aridez humana, do deserto, do solo, do homem horizontal.
"Lobos em pele de lobos"
Como se a realidade fosse feita de um total negrume e tudo o que houvesse no pensamento adormecido do universo fosse um quadro negro e estático, as imagens vão queimando a tela, intrusa aparição, ferida que ao se abrir cria figuras, objetos, cenários, seres humanos. Existe o deserto, existe o petróleo. E existe o homem. Existe a dor deste invasor ante a monstruosidade de uma luz que parece pecar, suando-lhe nas faces, afogando-o no pó, no árduo trabalho de garantir sua sobrevivência. Existe o escândalo das coisas silenciosas, e existe o silêncio, propriamente dito, da pequenez da vida humana.
Assim, surgem os primeiros, longos e silenciosos minutos de Sangue Negro. Inesquecível como em 2001-Uma Odisséia no Espaço, de Kubrick. Mensagem direta que percorre todo o filme: a aridez humana, do deserto, do solo, do homem horizontal.
Daniel Day-Lewis incorpora o personagem, Daniel Plainview. Ganancioso, astuto, uma serpente rastejante, esgueirando-se nas imundícies do lodo negro, lamaçal que lhe é a razão de viver, de onde extrai sua fortuna, mesmo que precise fazer uso do angelical rosto do filho adotivo em seu favor. Lobo na pele de lobo, apoiando-se na pureza de um cordeiro para obter vantagem nas negociações. O ápice da relação entre pai e filho lembra os momentos brutos de “Carta ao Pai”, de Kafka. Na cena crucial que expõe suas divergências morais, o pai e o já adulto filho, protagonizam o diálogo de libras (linguagem de surdo-mudo) mais visceral da face da terra. Diálogos que pontuam o filme, poderosos, nunca desperdiçados, tão cortantes quanto confessionais. Às vezes são usados para preparar o terreno. Outras, para disparar o vigor de sua franqueza atroz. Vejo o pior das pessoas, diz Day-Lewis. Apenas quero enriquecer e me isolar, confessa o magnata do petróleo. Um reconhecimento de que, mesmo rico, é incapaz de lidar com o poço negro que constitui sua amarga personalidade. Contrariando sua ascensão social, seu lado emocional despenca num abismo corroído, já que não pode comprar a paz interior, resgatar a harmonia familiar ou, simplesmente, ter amigos. Junto a Plainview, o jovem pastor Eli, empenhado na construção da Igreja da Terceira Revelação; também sem escrúpulos e ambicioso, cuja retórica constitui um entrave aos planos de Plainview, exceto se fizerem um acordo, óbvio. Entre os dois, cenas pungentes, confrontos, fé, hipocrisia e culpa. A redenção que se encontra somente quando não se tem para onde ir. Somado a isto, o pano de fundo da construção de uma nação: religião e capitalismo.
A época, virada do século vinte, início da expansão americana, da crescente indústria do petróleo – consta que o primeiro poço foi perfurado em 1859 –, e dos grandes volumes de dinheiro que fariam da América o que ela hoje é, rica e desonesta.
O diretor P.T.Jackson, que adaptou o roteiro do livro Oil! (1927), de Upton Sinclair, é sempre respeitável. Pela carreira sim, mas também por manter o peso que o filme exigia. Peso este que diz respeito à lei da gravidade, que lança as pessoas ao solo. Um filme sobre homens que rastejam, seja por uma imposição de regras ou por, em alguns casos, ser esta a sua verdadeira natureza.
A época, virada do século vinte, início da expansão americana, da crescente indústria do petróleo – consta que o primeiro poço foi perfurado em 1859 –, e dos grandes volumes de dinheiro que fariam da América o que ela hoje é, rica e desonesta.
O diretor P.T.Jackson, que adaptou o roteiro do livro Oil! (1927), de Upton Sinclair, é sempre respeitável. Pela carreira sim, mas também por manter o peso que o filme exigia. Peso este que diz respeito à lei da gravidade, que lança as pessoas ao solo. Um filme sobre homens que rastejam, seja por uma imposição de regras ou por, em alguns casos, ser esta a sua verdadeira natureza.
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