sábado, 24 de setembro de 2011

Recortes


Agridoce

Plangentes, violões. Não os de Cruz e Souza. Mas os de Elliot Smith, Jose González, Smog, estes cavaleiros solitários. Ou os dedilhados dos filmes de Inarritu. Alguns aspectos da arte em que o Verbo cessa, em que o lógos se finda. Sem palavras.

Cena 1: Rocco Sifried pilota um helicóptero. E uma mulher lhe sorri. Estavam voando baixo. Europeus num dia frio, ricos. Eles possuem corpos que os possuem. Carne, sangue, suor, maquiagem. Atores pornôs, jovens e tristes. Tão sós. Máscaras com formato de riso. Flertando. Me sinto sufocado, como que com a cabeça enfiada num saco plástico.

Cena 1b- Mickey Rourke, em o Ano do Dragão. Cabelo grisalho. Como um dente de alho. Disse a um china: tenho cicatrizes até na alma.


            Cena 2: É férias de algum modo. Por uma questão de idiossincrasia, poderíamos chorar todos os dias. Intensamente. Diríamos certamente que nãoexplicação para isso. Simplesmente é assim que acontece, como naquelas tardes de arco-íris. O chão de repente voa. E a gente vai correndo logo atrás, perseguindo. Então penso: é férias, de algum modo. Como uma mentira engraçada. Existir é uma coisa que dói à toa.

Cena 3: Chloe, a personagem de Alain de Bottom em Ensaios de Amor, tinha fixação por desertos. Um dia ela joga tudo para o alto e vai para um local isolado. Fica por , no meio do nada, por quinze dias. Depois, não vendo sentido em tudo aquilo, arruma um emprego numa lanchonete.

Cena 4: Emily Hirsch, em Na Natureza Selvagem, joga tudo para o alto. Uma faculdade, sei , um monte de coisas. Abandona a família e, tal qual Kerouac On The Road, põe o na estrada. Penso que ele é egoísta, que possui um pai e uma mãe que se preocupam com ele, enquanto ele acampa na mata e Doutor Jivago. Trata-se de uma pessoa livre agora, embora sequer tenha envelhecido.

Cena 5: James Spader e Andie Macdowell, e seu sexo e mentiras e videotapes. Sentados em uns degraus de alguma casa confortável. Ela usa um vestido longo, como uma senhora de trinta anos, uma adolescente livre sobre gramas. Diante de uma árvore robusta. Ele tem uma crista alourada, como uma onda num dia mais brilhante, areia de praia, coroa. Ela lhe diz: você não pode se abrir como um presente...

Cena 6: eu lia os artigos do Paulo Francis. Os dias eram longos. Cheiro de tinta, quadros amadores pintados no quarto. Jornais no chão para folhear. A capa do livro do Camus. Um rosto sem uma espinha sequer.

Três Corações, Julho de 2011, relendo as coisas de Agosto de 2010. Rabiscos com datas e décadas. Escrevo. E penso no quanto a vida pode ser engraçada e ao mesmo tempo triste. Agridoce. Talvez. Muito agridoce. Há um tempo que não chove. Sinto, à distância, a chegada do verão.

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