Ao avistar o dono , de longe o cãozinho late. Faz, sobre a laje da casa , uma pose de Rei Leão . Uma festa . E um companheiro .
— Você chorou hoje , parecia me dizer . Au, au. Olhos inchados. Au.
Ao ouvir o latido , todos os cães da rua acompanharam. Pareciam chorar junto .
A menina , na porta da escola , despediu-se do namorado . Franzina . Os braços pendiam finos sob o corpo enlaçado. Claros , lisos , como os próprios cabelos , saíam das mangas da camisa preta de rock.
(passei esse tempo todo pensando em você ...)
Se dancei, não mais sei. Você ouve o saxofone ao longe . E o dia está começando. De novo . Pra quem ...?
A novela das sete irá te socorrer . Você rirá com as trapaças , com as tragédias alheias, contadas de forma inacreditável , inaceitável . Volume alto . Olhará para o alto da noite , e perguntará às estrelas aquelas mesmas coisas . Será que o Pelé vai pro céu ?
A solidão da janela à meia luz , lá em cima , naquele apartamento . Cortinas abafando a música . E o amor .
A solidão da janela à meia luz , é minha .
A cidade não se parece com nada . Absolutamente nada . Nenhum lugar de lugar algum . É só uma estrada à toa , como essa poeira fina no redemoinho . Como eu ou a sombra humilde do poste na esquina , que se estende timidamente pela calçada . Um cone assustado pedindo licença o tempo todo . All the time . Me autorize a ser . Alguma coisa , qualquer coisa que seja.
A novela das sete irá te socorrer hoje . Volume alto . Únicas vozes ouvidas no dia . E você rirá com aquela conversinha. Riso de esquilo . Ri-ri-ri-ri-ri. Contemplará, como muitas vezes antes , no verão , o alto das constelações . E perguntará se a Bahia caberia na Lua . Como faríamos para mandá-la para lá ? Você olha para o lado e finge que comenta com alguém . Finge, uma esfinge .
A solidão daquela janela inexiste. Nem janela ela é. A tumba . Muda , fim sem ponto final . Acabou. Riso que não se completou. Ou poderia ser só você dizendo coisas sobre o esquecimento em fuga . Círculos , redemoinho fugaz . Somente eu , os saxofones e as persianas num entardecer de céu areia.
Mas eu era moço, tinha o remédio em mim mesmo .
(Memórias Póstumas de Brás Cubas-Machado de Assis)
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