sexta-feira, 16 de julho de 2010

Filmes de ontem e de hoje:




AVATAR:
PARA ENCHER
OS OLHOS



Até bem pouco tempo a palavra avatar podia ser usada, basicamente, para se referir a três coisas: à crença hinduísta na descida de um ser espiritual à terra, ao desenho animado em estilo mangá ou, ainda, ao personagem que os usuários utilizam ao se associar à rede de relacionamentos virtuais Second Life.
Isso mudou a partir de 18 de Dezembro de 2009, data em que Avatar, o filme, foi lançado. O termo, assim como “nirvana” remonta a uma certa banda grunge dos anos 90, a partir de então deverá designar um marco do cinema.
E o que há de tão especial neste filme, além de ser o mais caro da história, já que foram necessários quase 500 milhões de dólares para sua realização? Em primeiro lugar a direção é de James Cameron, autor de Exterminador do Futuro (1984), Alien-O Resgate (1986) e Titanic (1997). Em segundo, foi produzido para ser visto em 3D, um tipo de projeção tridimensional que busca provocar no espectador um mergulho nas imagens, em definição e profundidade, dando maior realismo às cenas que, sendo artificialmente produzidas, proporcionam uma nova maneira de experienciar cinema. Por isso a aspiração de Avatar não é pouca: pretende se consolidar como um novo padrão de linguagem.
Na tela, florestas fluorescentes, seres e animais exóticos compõem um mundo multicolorido e exuberante. Para adentrá-lo, precauções foram tomadas para que os espectadores não sentissem tonturas ou dores de cabeça durante a exibição, que foram desde os anos 50 empecilhos para este tipo de projeção. Consta que, no Brasil, temos poucas salas com telas especiais para o 3D – somente em São Paulo e em Curitiba, dizem – e, por isso, os efeitos são amenizados. De fato, para quem assiste nas poltronas mais próximas, nos primeiros minutos a sucessão de imagens ágeis, com viradas bruscas de 360 graus, pode causar desconforto, como se olhos e cérebro, ainda não habituados ao cenário, fossem mecanismos antiquados, incapazes de captar e interpretar adequadamente a ação que se desenrola nas cenas panorâmicas. Mas é de supor que este efeito, sendo momentâneo, também o seja proposital.
Todo este apuro técnico garantiu recordes de bilheteria, mas não estatuetas de Oscars que, em 2010, foi para Guerra ao Terror. Mas talvez, para o diretor, o reconhecimento da Academia nem seja tão importante assim, afinal, este é o filme da vida de Cameron, que esperou mais de dez anos para que fosse desenvolvida a tecnologia – inclusive com sua ajuda - necessária para realizá-lo. É como se fosse seu Star Wars (1977), lembrando aqui o filme que o fascinou e o fez entrar para o ramo.
A história de Avatar é simples, previsível. É sobre seres humanos que pretendem invadir o planeta Pandora, em busca de um valioso minério. Mas para sobreviver à sua atmosfera, os humanos têm de entrar em uma máquina onde, através de projeção mental, assumem seu avatar, que é a extensão da pessoa em um outro corpo, no caso, em um corpo dos seres Na’Vi, habitantes de Pandora. É a releitura do mito do colonizador, do homem branco que se envolve com uma cultura que, ao lutar para manter seus valores, se torna hostil.
Atração principal, a caracterização dos Na’Vis, apesar de comentários depreciativos de serem uma fusão mal feita de Smurfs e Thundercats, é perfeita. Azulados, esguios, com cerca de três metros de altura e feições que mesclam indígenas, africanos e felinos, estas criaturas azuis proporcionam momentos poéticos e até românticos, capazes de levar o público mais exaltado a aplaudi-los em cenas tocantes. Até mesmo o Gollum, a versão má do Sméagal de O Senhor dos Anéis (2001-2003), foi superado. Citação, aliás, bastante apropriada, já que tal qual na obra de Tolkien, foi criado um dialeto totalmente original por uma equipe de lingüistas e fonoaudiólogos, com todos os requisitos gramaticais, sintáticos e morfológicos.
Como nas obras anteriores de Cameron, a protagonista, Neityri, é corajosa e durona como Ripley (de Alien) e Sarah O’Connor (de Terminator), mas bem mais pueril que suas antecessoras. Curiosamente Sigourney Weaver está no elenco, dessa vez como uma pesquisadora, deixando a infantaria para Michelle Rodriguez, de Lost (2005).
Já as referências que remontam à simbiose entre homem e natureza, ao animismo indígena ou ao misticismo holístico, podem soar pedantes, pois lembram os clichês discursivos das causas ecológicas e as doutrinas algodão-doce da Nova Era. Mas isso não compromete o entretenimento. E a simbologia, não apelando para apologia, não relativiza os conceitos de bem e mal, prevalecendo assim o tratamento dado à diversidade cultural, à busca do convívio pacífico entre civilizações.
Se o roteiro tem sido criticado por se assemelhar a Pocahontas (1995), O Último dos Moicanos (1992) e Dança com Lobos (1990), os efeitos especiais deverão prevalecer e ocupar o mesmo papel que fizeram de Matrix (1999) uma obra de referência copiada até hoje. Mas, afinal de contas, acaso Titanic tinha roteiro?

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