A Lógica
Para aqueles dentre nós que se introduzem na Lógica, falemos previamente um pouco a respeito de sua característica própria, começando pelo gênero a que pertence, isto é, a Filosofia. Ora, Boécio, não chama de Filosofia qualquer ciência, mas apenas a que se detém nas coisas mais elevadas; de fato, não chamamos de filósofos a quaisquer pessoas dotadas de conhecimento, mas apenas aquelas cuja inteligência penetra as sutilezas.
Boécio distingue três espécies de Filosofia, a saber: a especulativa, que se ocupa da natureza das coisas a ser investigada; a moral, que se ocupa da dignidade da vida a ser considerada; a racional, denominada Lógica pelos gregos, que se ocupa da ordem dos argumentos a serem compostos. No entanto, alguns, ao separarem esta última da Filosofia, diziam que ela não é parte da Filosofia, mas antes instrumento segundo o testemunho de Boécio. Isso porque, de um certo modo, as demais partes dela se ocupam, na medida em que se servem de seus argumentos, para provar suas próprias questões.
Assim, se se coloca uma questão pertinente à investigação da natureza ou da moral, os argumentos são tirados da Lógica. Contra esses, o próprio Boécio diz que nada impede que a Lógica seja tanto instrumento como parte de algo, assim como a mão o é em relação ao corpo humano. Além disso, a própria Lógica se apresenta muitas vezes como instrumento de si própria, visto que demonstra também uma questão a si pertinente com argumentos seus como, por exemplo, a seguinte: o homem é uma espécie de animal. Contudo, nem por isso é menos Lógica, por ser instrumento da Lógica. Assim, também não é menos Filosofia por ser instrumento da Filosofia. O próprio Boécio a distingue das duas outras espécies de Filosofia pelo seu fim próprio que consiste em compor argumentações. Pois, embora o estudioso da natureza componha argumentos, não é o estudo da natureza que o institui para tal, mas apenas a Lógica.
(ABELARDO, Pedro. Lógica para Principiantes. 2ª.ed. São Paulo: Unesp, 2005, p.39-40, in Marilena Chauí, iniciação à Filosofia, São Paulo: Ática, 2011).
Nenhum comentário:
Postar um comentário