Olho esta folhaembranco, colocada sobreminhamesa: percebo suaforma, cujacor, suaposição. Essas diferentesqualidades têm característicascomuns: emprimeirolugar, elas se oferecem ao meuolharcomoexistênciasque posso apenasconstatar e cujosernão depende de modoalgum do meucapricho. Elassãoparamim, nãosãoeu. Maselastampoucosãooutrem, isto é, não dependem de nenhuma espontaneidade, nem da minha, nem da de uma outraconsciência. Estão presentes e inertes ao mesmotempo. Essa inércia do conteúdosensível, tãofreqüentemente descrita, é a existênciaemsi. De nada serve discutir se essa folha se reduz a umconjunto de representaçõesou se ela é e deve seralgomais. O certo é que o brancoque constato não é minhaespontaneidadeque pode produzi-lo. Essa formainerte, que está aquém de todas as espontaneidadesconscientes, que deve ser observada, aprendida aos poucos, é o que chamamos umacoisa. De modonenhumminhaconsciênciapoderiaser uma coisa, porqueseumodo de seremsi é precisamenteumserparasi. Existir, paraela, é terconsciência de suaexistência. Ela aparece como uma puraespontaneidadediante do mundo das coisasque é purainércia. Podemos, portanto, afirmardesde a origemdoistipos de existência: de fato, é na medidaemquesãoinertesque as coisas escapam à dominação da consciência; é suainérciaque as salvaguarda e queconservasuaautonomia.
Maseisqueagora viro a cabeça. Não vejo mais a folha de papel. Agora vejo o papelcinza da parede. A folhanão está maispresente, não está maislá. Sei, no entanto, queelanão se aniquilou: suainércia a preserva disso. Ela deixou simplesmente de serparamim. Ei-la de novo, porém. Não virei a cabeça, meuolhar continua voltado para o papel da parede; nada se mexeu na peça. Contudo, a folhame aparece de novocomsuaforma, suacor e suaposição; e sei muitobem, no momentoemqueelame aparece, que é precisamente a folhaqueeuvia há pouco. É realmenteelaempessoa? Sim e não. Porcerto afirmo claramenteque é a mesmafolhacom as mesmas qualidades. Masnão ignoro que essa folha permaneceu lá no seulugar: sei quenão usufruo de suapresença; se eu quiser vê-la realmente, preciso virar-me para a escrivaninha, precisotrazer de voltameuolhar ao mata-borrãoonde a folha está colocada. A folhaqueme aparece neste momento tem uma identidade de essênciacom a folhaqueeuvia há pouco. E, poressência, não entendo apenas a estrutura, mastambém a individualidademesma. Sóque essa identidade de essêncianão é acompanhada de uma identidade de existência. É exatamente a mesmafolha, a folhaque está agorasobreminhaescrivaninha, masela existe de outromodo. Não a vejo, elanão se impõecomoumlimite à minhaespontaneidade; não é tampoucoumdadoinerteque existe em si. Em uma palavra, elanão existe de fato, ela existe emimagem.
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